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sexta-feira, agosto 27, 2010

Simplesmente, Dona Antonia

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 Por Régis Sanches
Dona Antônia e Régis Sanches - Anos 90

Mãe é mãe. Dona Antonia, a minha, é mais que mãe: é amiga. Sim. Porque existem mães inimigas. Lembrança da infância. Meu pai trabalhava em Caiena, íamos, minha mãe e eu, marcar consulta no Hospital Geral para algum irmão ou parente doente. Era madrugada, morávamos na Avenida Pedro Lazarino, sem asfalto, em frente à Vacaria do “Seu” Barbosa, baiano brabo, marido da cândida Dona Bené. Hoje o bairro se chama Santa Inês.

A longa caminhada até o Hospital Geral era entrecortada por pontes capengas. Sob o frio, os cães vadios latiam e avançavam sobre a gente. Minha mãe dizia: - Não tenha medo, o cachorro não vai te morder. Basta colocar a língua no céu da boca que ele vai parar de latir.

Até hoje, quando um cachorro vadio se aproxima, instintivamente, coloco a língua no céu da boca. Nunca me morderam. Minha mãe é católica fervorosa. Com o tempo, virei ateu, graças a Deus. Meu pai queria ter um time de futebol. Minha mãe, apenas uma menina. Somos cinco filhos: Régis Beck, Roka, Charlinho, Shang e Dinho. Um time de basquete, guitarristas e roqueiros.

A menina, tão esperada, veio muitos anos depois: é Ana Luiza, minha única filha, mineira de BH. Ela vai completar 15 anos, justo em 13 de setembro, dia da criação do Território Federal do Amapá.

Dona Antonia foi tocando a vida. A mãe, ela perdeu cedo, vítima de uma febre misteriosa em Anajás, no Arquipélago do Marajó. Artesã criativa e habilidosa, em Macapá e Santana minha mãe teceu sonhos. O maior deles se concretizou: todos os seus filhos têm curso superior. Hoje, ao escrever este texto no teclado do computador lembro nitidamente: a primeira vez em que ela me entregou um caderno improvisado feito com folhas de papel de embrulhar pão. E um lápis bem curtinho, que ela me ensinou a apontar com Gillette.

Também nos incentivou a tocar um instrumento, a ler poesia, a acumular cultura. Assim é Dona Antonia. A mulher que abriu mão de seus sonhos para realizar os dos outros. Poderia ser canonizada, pois tem uma generosidade infinita e sempre demonstrou grande espírito de solidariedade. Eu, que não acredito em Céu ou Inferno, sei que o paraíso existe: fica em Vila Amazonas. É o jardim da minha mãe. Onde ela conversa com suas plantas e tira energia para seguir vivendo. Vida longa à Dona Antonia.

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