Por Ronaldo Rodrigues
Sei que se movia numa região pantanosa.
Entre a muralha do castelo da realidade e seu coração, havia uma ponte elevadiça há séculos emperrada.
Setenta anos se passaram sem notícias dele. A cidade não dormia. Ele tinha levado não só o sonho, mas o sono de toda a gente. E somente aos domingos, embaixo da árvore da dúvida, era permitido falar nisso.

Quando ele retornou, numa quarta-feira de cinzas, comandando a nau do esquecimento, sua barba o escondeu tão bem que nem seu cachorro Madrugada, grande devorador de sábados, o reconheceu. E seu irmão gêmeo jurou nunca ter visto aquele rosto.

No outono, veio a revelação. Quando sua barba caiu por completo, seu melhor amigo de infância, que se tornara próspero comerciante, lhe cobrou aquela dívida de jogo, motivo de sua fuga.
Então, a cidade inteira o reconheceu, o cercou junto ao poço da solidão e passou a devorá-lo como antigamente. Só as árvores o reverenciaram, tangendo no deserto da noite um rebanho de estrelas cadentes.
ÉGUA Ronaldo! Tua mente é um mundo encantado que eu adoro!
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