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quarta-feira, agosto 01, 2012

Velho, eu?

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Sabe quando descobri que estava ficando velho? Foi quando... Deixa ver se me lembro... Ah, sim! Foi quando comecei a ter problema de... de... de quê mesmo? Eu comecei a ter uns lapsos, dava uns brancos, umas falhas de... Sim! Lembrei! De memória! É isso! Comecei a esquecer as coisas, esquecer nomes de pessoas, datas... E comecei a perder as coisas. Já perdi óculos, isqueiro, celular. Só não perdi o piano lá de casa por dois motivos: nunca tive piano nem casa.

Quando se está ficando velho é um terror. Dói aqui, dói acolá. Um dia o reumatismo bateu tão forte que quase não consegui levantar da cama pra pegar minha dentadura dentro do copo d’água.

Mas eu não me acho tão velho assim. As pessoas em volta é que acham. Outro dia tive que entrar no ônibus pela porta da frente. O motorista e alguns passageiros não permitiram que eu entrasse pela porta de trás. E me fizeram sentar numa cadeira especial para pessoas da terceira idade. O motorista, todo solícito à maneira dele, ainda falou:
- No meu ônibus velhinho tem prioridade!

Encontrei um amigo e falei dessa paranoia com a idade. Ele disse que não havia motivos pra preocupação. E garantiu que eu estava igualzinho ao que era quando me conheceu, vinte anos atrás. A mesma cara, o mesmo corpo. Achei legal. Fique animado com aquilo. Alguém finalmente percebeu que não estou tão velho quanto imagino. Aí ele esclareceu: é que eu, desde aquela época, vinte anos atrás, já tinha cara de velho, corpo de velho, roupa de velho, manias de velho...

A paranoia bateu forte mesmo quando revi minha primeira namorada. Estava do mesmo jeito: lindona, sarada, uma gata. Quando a vi chegando, fiquei tonto, a respiração falhou, as mãos tremeram, o coração disparou, por pouco não parou. Desmaiei na hora e, alguns segundos antes de cair, ouvi alguém gritar:

- Mataram o velho! Segura o velho!

Ainda pensei em protestar, mas minha cara já tinha aterrissado na calçada, o sangue jorrando do nariz, as pernas trançadas.

Acordei no hospital, na ala de geriatria. Por que me trouxeram pra cá? Só tenho 46 anos, alguns fios de cabelo branco, mas é uma tintura que eu passo, pra dar charme, sei lá...

O médico me encheu de remédios, passou uma bateria de exames, tudo pra idoso. Ainda falou que eu devia me cuidar, não era mais um garoto, essas coisas. Fiquei meio puto com aquele médico, que aparentava ser bem mais velho do que eu. Falei que nunca mais queria vê-lo. Ele respondeu, na maior calma, que muito em breve eu não o veria mesmo. Nem ele, nem meu rosto no espelho, nem qualquer coisa. Minha visão estava com os dias contados. Coisas da idade... Aí eu perdi a calma e só não o agredi porque não consegui encontrar minha bengala. Ai, minha coluna!

Ronaldo Rodrigues

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