Nascido em Prainha, no município de Monte Alegre, no estado Pará, Walter Pereira do Carmo conhecia o recém-criado Território do Amapá por vir com os pais visitar parentes em Mazagão Velho. Aos 17 anos, já funcionário público com formação técnica em agrimensura, começou, sem saber, a traçar seu caminho para o Amapá. Dizem que sua vinda definitiva deu-se ao cumprir uma missão da antiga Comissão de Rodagem do Pará, que depois seria transformada no DEER (Departamento Estadual de Estradas de Rodagem). A missão era, justamente, entregar o projeto da BR 156.
Era o decisivo 1952, e Walter, com 22 anos, foi convidado pelo então governador Janary Nunes, para ficar no Amapá. Aceitou e começou a trabalhar no ramal do Aporema e na manutenção do trecho da outrora BR 15, que só chegava até a Base Aérea do Amapá. Foi naquele município que conheceu Helita Ferreira dos Santos, filha de um pecuarista da cidade de Amapá, com quem casou seis meses depois, sendo o governador Janary Nunes um dos padrinhos. Dessa união nasceram sete filhos, Margareth, Walter Júnior, Waldenawer (Keky), Mariângela, Wank, Márcia e Walber.
Em 1958 surgiu a oportunidade que mudaria o rumo de sua vida e dos amapaenses. Pauxy Nunes, irmão de Janary, assumiu o governo e priorizou a continuação da abertura da rodovia em direção ao Oiapoque, que passava em aldeias indígenas. O medo de enfrentar os índios, que tinham pouco contato com a civilização, dificultava a contratação de empresa. Sem dinheiro, mas muita vontade de começar o serviço, fundou a Construtora Comercial Carmo LTDA.
“Aqui chegamos e muito mais longe iremos”. (Walter do Carmo, ao chegar em Oiapoque)
Em 1958 as máquinas pesadas, nunca antes vistas por aqui, chegaram via marítima, e o serviço começou. A estrada era aberta até Amapá, e a missão era chegar até a fronteira. Foram meses embrenhado nas matas com homens e equipamentos, abrindo o caminho que até então era percorrido por poucos. Entre Macapá e Amapá, já chefe de família, Walter do Carmo viveu todas as particularidades de um desbravador, quando o mundo oferecia poucos recursos para aventura, como a abraçada pelo então empreiteiro.
“Nunca fui rico, apenas tinha crédito na praça”. (Walter do Carmo)
No dia 24 dezembro de 1974, em um pequeno Jeep, Walter do Carmo, na companhia de Zé Grande e do mestre Ouvídio, escoltados por uma Toyota, dirigida por Vicente Cabraia, conseguiram chegar até o Oiapoque. E após dezesseis anos, como foi acertado com Janary Nunes, a BR156, que liga Macapá à fronteira foi entregue ao então governador Ivanhoé Martins.
Além da BR 156, Walter do Carmo foi o responsável por levar o progresso para outros cantos do Território. Foi ele quem abriu os ramais para que veículos entrassem mais facilmente nos municípios de Amapá e Calçoene, Base Aérea do Amapá e para a localidade de Lourenço. Construiu ainda campos de pouso em Tartarugalzinho, Calçoene e Cunani.
Tudo corria bem até que o contrato com o Governo foi reincidido na administração de Artur Azevedo Hening, em 1975, ignorando uma das cláusulas do contrato que previa o translado do maquinário para a capital. As máquinas utilizadas na construção da BR 156 ficaram abandonadas ao longo do primeiro traçado da estrada e jamais foram recuperadas. Pela quebra do acordo contratual foi movida uma ação contra o Território, que foi vencida pelo empresário muitos anos depois, quando a Construtora Comercial Carmo LTDA já estava fechada. O dinheiro serviu para pagamento de indenizações trabalhistas e multas do INSS.
Construtor, pioneiro, desbravador e aviador
Nos anos 70 construiu as tradicionais escolas José de Alencar, José de Anchieta, Antônio João, Princesa Isabel e Castelo Branco. Além do primeiro Ginásio coberto da cidade, o Paulo Conrado Bezerra e os clubes mais bem frequentados, Círculo Militar, Macapá e Amapá Clube. Além de desbravador e construtor, Walter gravou seu nome na história do Amapá como pioneiro, palavra que levava ao pé da letra. Foi um dos fundadores do Lions Clube, Maçonaria, Igreja Messiânica, e sua paixão: o Aeroclube.
Realizou um sonho de infância em seus anos de ouro, quando tornou-se aviador. Ao conhecer o boliviano, Capitão Belarmino Bravo, juntou seu desejo e espírito empreendedor, à paixão do visitante, e juntos formaram a primeira turma de pilotos “brevetados” da cidade, e fundaram o Aeroclube de Macapá, em 1956. Na turma estava Hamilton Silva, que morreu em 1958, no acidente de avião em que também faleceram o deputado Coaracy Nunes e seu suplente, Hildemar Maia. Diziam na época que estava prevista a ida de Walter do Carmo nesta viagem.
“Prefiro dormir sem ceia do que acordar com dívida” (Walter do Carmo)
Em 1985 o governador Jorge Nova da Costa, acreditando em seu potencial, deixou sob sua responsabilidade o asfaltamento de 50 km da BR 156, e Walter do Carmo foi buscar no Paraná a empresa CR Almeida para o serviço. No ano de 2003 o governador Waldez Góes o nomeou assessor especial, como conselheiro da gestão, cargo com que sobreviveu até 2010. Ao morrer, no último dia 14, recebia apenas a pensão do INSS.
A ação de milhões ajuizada pelos associados e familiares do Aeroclube, por ter o Governo do Amapá instalado órgãos públicos, hoje Centro Administrativo, na avenida Fab, sem desapropriar a área, ainda corre na Justiça do Amapá. Além dos sete filhos com Helita, entre eles o Keky, médico recém-formado falecido há 28 anos, Walter deixou mais dois filhos, Walmir e João Vitor.
Texto da jornalista Mariléia Maciel
Fotos (clique nas imagens para melhor visualizá-las) do acervo da família de Walter do Carmo
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