Por Régis Sanches
Ela tinha todos os motivos para ser uma mulher amarga, cultivar a vingança, levando a sua vida com os olhos pregados no retrovisor. Afinal, Maria da Penha levou um tiro nas costas, disparado à queima-roupa pelo então marido, enquanto dormia. Mas, ela seguiu em frente. Embora paraplégica, ergueu a cabeça, removeu de seu coração o rancor e as lembranças negativas. Ela conseguiu vencer o medo e narrou sua saga em um livro. Mais que isso: com sua humildade e determinação, Maria da Penha transmutou-se na Lei, que, aos poucos vai mudando para melhor o cotidiano de mulheres que, anteriormente, apanhavam caladas dos maridos.
Aos 69 anos, Maria da Penha esteve em Macapá na última quarta-feira, 30 de abril, Dia Nacional da Mulher. Trazida à capital amapaense pelo Ministério Público do Estado do Amapá, ela contou sua história para um auditório apinhado de mulheres, no Museu Sacaca. Após haver dito que “todas as mulheres precisam vencer o medo”, nossa heroína disse que a violência dos homens que não amam as mulheres nasce no berço. Para Maria da Penha, a fúria assassina, da qual ela própria escapou com sequelas, é um efeito colateral da educação que é ministrada, de forma diferenciada, para meninos e meninas. Em uma palavra, o nascituro da violência doméstica é o machismo.
Antes de subir ao palco, Maria da Penha cruzou as passarelas de madeira do Museu Sacaca em sua cadeira de rodas. Estava serena, sorridente, transmitia uma aura de quem aprendeu a perdoar. No decorrer de sua palestra, a voz pausada com leve sotaque nordestino, a certa altura, ela disse que as viagens são cansativas. “Se as pessoas me convidam para narrar minha história, eu sei que vou ficar extenuada. Mas, eu não recuso esses convites porque sei que posso influenciar novas mulheres a vencer o medo”, ela confessa.
No instante mais emocionante de sua narrativa, Maria da Penha revelou o segredo, o fator primordial que a fez encontrar forças para vencer o medo e seguir em frente. Ela internalizou em sua mente uma frase lapidar de Martin Luther King, líder negro e ativista dos direitos civis norte-americano: “O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons”.
À saída do Museu Sacaca, os comentários das mulheres que se acotovelaram para ouvir uma história real, um exemplo de como superar uma injustiça com o mais alto grau de dignidade, poderiam ser resumidos numa frase. Maria da Penha é nossa heroína. Ave Maria da Penha.
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