Depois do temporal fiquei olhando aquele mar sem fim que a chuvarada tinha plantado.
Eu tinha ficado só no mundo, depois do dilúvio.
Minha preguiça não me permitiu concluir o grande barco que a voz tinha dito para eu construir.
Era um sonho louco que eu tinha toda vez que chovia muito.
Uma voz me dizia para eu construir um barco imenso, onde coubessem muitas espécies de animais.
Uma dessas chuvas poderia demorar muito a passar, alagar e afogar todos os que não estivessem no barco.
Até comecei.
Pedi a um amigo construtor de barcos para desenhar um esquema que eu pudesse executar.
Ele esboçou uma arquitetura naval impressionante, bem mais avançada que as loucuras de Da Vinci e sem aquelas frescuras que Niemeyer adorava inventar.
Julio Verne não teria conseguido imaginar algo tão engenhoso.
Desenhou um barco que, se estivéssemos num filme, poderíamos batizá-lo de Titanic, tal sua imponência e capacidade de navegação.
Eu fiquei de comprar o material e construir o bruto do barco, do jeito que a voz mandou.
Mas dava uma preguiça danada pensar naquilo, aliada ao fato de que a inflação crescia e o dinheiro diminuía.
Sei que se tivesse me empenhado teria conseguido juntar a grana.
E não estaria agora só, no meio do mar.
Vou dormir e tentar sonhar com a voz. Quem sabe ela me diz o que fazer.
Ronaldo Rodrigues
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